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A criança como ser mimético

Foto do escritor: Davi SilvaDavi Silva

Atualizado: 19 de out. de 2024

 

A criança como ser mimético

Esse texto objetiva  apresentar a criança como um ser mimético, ou seja, que imita, portanto devemos apresentar a ela sempre os melhores exemplos para ela seguir. Para isso, iremos nos embasar inicialmente no conceito Aristotélico de mimese, aplicado ao teatro grego. Depois, entender o processo de imitação como uma ferramenta de aprendizagem e formação do caráter, que deve se utilizar dos melhores e dos piores exemplos para educar, a fim de produzir uma purificação da alma. Por fim, buscaremos apresentar os pais como os principais exemplos a serem imitados, por isso esses devem se atentar para o que estão transmitindo com suas vidas aos seus filhos, pois o processo também pode ser o inverso, ou seja, os pais serem o exemplo a não ser seguido.


Aristóteles e o homem como ser mimético

A mimese é um termo chave na filosofia platônica, em que o autor defende que o mundo em que vivemos é uma imitação de um mundo real – mundo das ideias, e que, portanto, todo ser objetiva imitar um ente ideal em que ele participa e que busca ser igual. Por exemplo, uma árvore busca com todas as suas energias parecer com uma árvore ideal que existe no mundo das idéias, para Platão. Diferentemente, Aristóteles aplica a mimese à crítica da arte, mais especificamente ao teatro. Em sua época, o teatro grego era o ápice da cultura grega, que por sua vez era o apogeu cultural do mundo antigo. O teatro era utilizado nesse contexto para enculturar o povo, através da apresentação dos melhores e piores exemplos, por isso, era incentivado inclusive pelo Estado, pois era o processo de formação do imaginário da sociedade. Com o estagirita temos o grande embasamento desse texto, em sua obra “Poética”, em que ele introduz a crítica literária, com ênfase no teatro. Segundo Aristóteles, na obra Poética, o objetivo da dramaturgia é promover a “catarse” de quem está assistindo, ou seja, a purificação da alma pelo exemplo que está sendo apresentado. Por exemplo, a história de Édipo, escrita por Sófocles, dá a oportunidade de quem a assistir refletir sobre o conflito entre livre-arbítrio e a imposição do destino e o leva a tomar atitudes baseadas no exemplo da vida da personagem.  O autor introduz sua obra apresentando o ser humano como um ser que imita, desde a infância somos propensos a imitar, desde o modo como aprendemos a falar, andar, até escrever e se comportar. Ou seja, somos seres que observam e instintivamente, como intencionado no teatro grego, passamos a imitar, e isso produz uma “tipo” de ser, que pode ser ao acaso, como pode ser intencional, como deveria ocorrer com uma criança.


A educação pelos melhores exemplos

A crise da educação  moderna é claramente visível, vide o número de analfabetos funcionais  que produzimos no Brasil anualmente. Um dos reflexos dessa crise é a retirada do uso dos melhores exemplos para se educar, algo que sempre percorreu a história da educação. Diante disso, é importante retomar o conceito de educação pelos exemplos como visto na literatura clássica. Falar de educação moderna é sempre um tema delicado, considerando que esse artigo não objetiva uma análise aprofundada dos problemas da educação moderna, vamos apenas apresentar os fatos, há um sério problema na educação atual, qual é esse problema e como solucioná-lo são assuntos mais amplos e que merecem mais atenção. Mas o pressuposto do problema já é um ponto de partida para a nossa reflexão. Como mencionado anteriormente, e reconhecido pelo próprio mundo moderno, a Grécia clássica foi um dos tempos áureos do desenvolvimento, tanto político, com a democracia ateniense, quanto cultural, com o teatro, esculturas e arquitetura, e tudo isso passava, obviamente, pelo processo educacional ou de enculturação do povo. Para isso, o teatro foi a grande ferramenta para moldar a mente do cidadão, e essa arte nada mais era do que a apresentação de exemplos, melhores (como os semideuses e heróis) ou piores (como nas comédias) que nós. Nesse processo, o povo via a si mesmo, nas personagens, que apresentavam situações reais e possíveis, para que, com isso, o cidadão aprendesse a agir em um contexto semelhante. Tudo isso produziu uma das sociedades mais frutíferas da história. Em contrapartida, observamos dados alarmantes na educação moderna, como indicado pelo número de analfabetos funcionais, que passaram pela escola. Não tenho a pretensão de diminuir a crise em apenas um argumento, no entanto, para fim de comparação direta com o tema que estamos tratando, um dos motivos é a quebra do padrão clássico de imitação como ferramenta básica de aprendizagem. A fim de corroborar com esse assunto, é possível adentrar mais na cultura grega, principalmente em sua literatura, que se tornou sua dramaturgia, para entender o processo de enculturação dos seus cidadãos. Para tal, nada melhor do que tomar a Ilíada, de Homero, pois ela é a base de toda a cultura grega. Nessa poesia épica, que era estrutura de toda a educação das crianças gregas, as personagens eram uma ferramenta de exemplo a ser, ou não imitado. Exemplos: Nestor era um grande exemplo de líder, Ulisses era astuto, Aquiles era corajoso e bravo. Ou seja, é possível notar que as crianças gregas tinham exemplos de virtudes que desejavam imitar, um jovem tinha como exemplo a coragem de Aquiles para se revestir quando sentia medo, ou o exemplo de Ulisses para sair de uma situação adversa. Diante de todos esses pontos, cabe resumir que, a educação bem executada passa por apresentar ao educando exemplos para se imitar, exemplos esses que o virão à mente, naturalmente, quando passarem por situações que o desequilibrem. Quanto mais próximo e orgânico esse exemplo, mais absorvido e internalizado será para a criança, e consequentemente, passará a fazer parte da sua essência, o que pode ser uma ótima ou péssima notícia, a depender do exemplo que lhe está sendo apresentado para imitar.


A responsabilidade do pai ser imitável

Qualquer pai ou mãe irá concordar que seus filhos, principalmente quando pequenos, são principalmente imitadores. Eles, inicialmente, respondem ao nosso sorriso, sorrindo, eles falam as primeiras palavras de tanto insistirmos no “mamãe” e “papai”, eles nos olham comendo e querem comer igual, nos olham andando e tentam imitar… durante toda a primeira infância esse é o processo básico de formação da criança, imitação. Após isso, os hábitos começam a ser imitados, as falas e jeitos, e consequentemente as VIRTUDES e os VÍCIOS. Muitas vezes legamos isso a características hereditárias, inatas, no entanto, a imitação pode ser uma das explicações para esses hábitos.   Como vimos, a base da educação grega era o exemplo, e não existe exemplo mais impactante na vida de uma criança do que seus pais dentro de casa. Isso acarreta em uma grande responsabilidade de ser imitável. Ou seja, ao cobrar virtudes dos filhos, os pais devem ser os grandes exemplos dessas virtudes, além deles, rodear a criança de exemplos imitáveis deve ser uma grande preocupação dos pais, sabendo que eles irão absorver os comportamentos de modo praticamente orgânico e imperceptível, e todos sabemos que após um hábito ser internalizado, retirá-lo é uma grande dificuldade. Justamente diante disso, o oposto também é verdadeiro. Os pais devem afastar ao máximo as crianças de maus exemplos, de comportamentos viciosos, pois esse será, com certeza, um complicador do desenvolvimento de virtudes na criança. É claro que sabemos ser impossível afastar completamente a criança de exemplos negativos, no entanto, para sabermos como lidar com isso, voltemos à cultura grega. Os exemplos apresentados eram de dois tipos, bons exemplos para serem imitados e maus exemplos para serem repelidos. Portanto, apresentar maus exemplos também é uma ferramenta de condução à virtude, desde que orientado e explicado, com o intuito de formar o indivíduo, apresentando as consequências de um caminho de vícios. Por conseguinte, é possível absorver que os pais são os principais responsáveis por serem os imitáveis aos seus filhos, e esse processo é de suma importância para a formação da criança e do adolescente. Além disso, a condução a um ambiente, na medida do possível, virtuoso, irá auxiliar na formação de hábitos saudáveis e a exposição de situações viciosas devem ser conduzidas para a reflexão e indicadas como exemplos a não serem seguidos


Conclusão

A criança é um ser mimético, portanto, a sua educação passa por apresentar a ela os melhores exemplos, com precedência aos seus pais, principais responsáveis pela sua educação. Vimos no exemplo da cultura grega o uso do exemplo como a principal ferramenta de enculturação, tanto nos exemplos de virtudes como de vícios.


Conheça a obra:



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