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A importância de Sócrates para os dias atuais

Foto do escritor: Davi SilvaDavi Silva

Atualizado: 19 de out. de 2024

A importância de Sócrates para os dias atuais

 

Pensar em filosofia é pensar em Sócrates. Saber que ele foi o mestre de um dos mais importantes pensadores da história, Platão, já é motivo mais do que suficiente para considerá-lo em mais alta estima. Além disso, olhar atentamente para os seus ensinamentos e sua vida, parece, no mínimo, prudente, para aquele que deseja compreender a história do pensamento. No entanto, a importância de Sócrates não se limita à sua época, mas também ele tem muito a contribuir aos dias atuais. 


Pensando nesse aspecto, esse texto buscará responder como Sócrates pode auxiliar o homem moderno em seus dilemas. Para isso, será necessário entender, mesmo que minimamente, o personagem Sócrates, quem foi ele, seu contexto, sua vida. Posteriormente, como suas ideias e descobertas ajudaram na formação do pensamento ocidental. E finalmente, conectar suas ideias aos dilemas do homem moderno, propondo como ele poderia auxiliar a sociedade atual.


Quem foi Sócrates?


Inicialmente, mesmo que rapidamente, é necessário entender quem foi Sócrates . Nascido em Atenas, foi um cidadão exemplar, defendeu seu país no serviço militar, inclusive sendo peça importante do exército. Mas foi apenas quando estava mais velho que sua vida começou a ganhar mais relevância, inclusive para o próprio Estado e a democracia ateniense. 


Sócrates viveu em um momento turbulento de Atenas, algumas guerras relevantes envolveram o período da sua vida, inclusive trocas de governos relevantes ocorreram enquanto estava vivo, não apenas isso, mas alguns de seus discípulos eram políticos influentes da época. Esse fato começou a colocá-lo em evidência, pois seus seguidores apresentavam algumas ideias diferentes, o que muitas vezes incomodava o espectro político da cidade. 


Na Atenas da época, a política, juntamente com a religião, se fundiam na vida do homem livre. Portanto, aqueles que desejavam crescer politicamente, no contexto democrático ateniense, necessitavam ser um bom orador. Diante disso, surgiu um movimento de professores itinerantes que ficou conhecido como movimento sofístico. Esse indivíduo se apresentava como grandes oradores e manipuladores das palavras. E foi nesse contexto que o ministério/missão de Sócrates se tornou relevante.


Conta a história que um grande amigo de Sócrates, Querofonte foi a Delfos e indagou o oráculo sobre quem era o homem mais sábio de Atenas, ao que o oráculo respondeu ser Sócrates. Ao ouvir isso, Sócrates fica perplexo, pois ele não se considerava sábio. E, para entender a intenção do deus ao dizer isso, ele passou a investigar a sua fala. Sócrates passou a interrogar os ditos sábios de Atenas, nas diferentes áreas, para comprovar que eles eram mais sábios que ele. No entanto, falhou. Mas o que descobriu foi ainda mais interessante.


Sócrates verificou que assim como ele, esses homens que se diziam sábio não o eram, mas diferente de si, eles se consideravam sábios, mesmo não sendo. Ao que concluiu o filósofo que a sua sabedoria estava em saber que não sabia, o que o fazia mais sábio que os ditos sábios, pois esses além de não saberem, arrogavam para si um conhecimento que na realidade não tinham. 


Essa investigação de Sócrates causou muito desconforto na cidade, pois ele causou constrangimento público a pessoas relevantes e importantes. Tal fato provocou um processo contra Sócrates. Não cabe no momento descrever o que ocorreu, mas ao final Sócrates foi condenado à morte e alguns dias depois estava bebendo o cálice de Cicuta, deixando a vida e entrando para a história.


Filósofo Sócrates
Busto de Sócrates

Como suas ideias ajudaram a formar o pensamento Ocidente?


Uma das principais contribuições socráticas para a formação do pensamento ocidental foi a modo como chega às suas conclusões. O método maiêutico foi revolucionário tanto para época como para a posteridade. Resumidamente, Sócrates acreditava no diálogo para obter conclusões verdadeiras. Portanto, a dialética, como ficou conhecida, era o método de conversação em que Sócrates conversava com o seu interlocutor com o objetivo de extrair dele a Verdade, o que ele chamava de Maiêutica, palavra que se refere a “arte de auxiliar no parto”. 


Essa expressão era muito significativa para Sócrates, pois se remetia ao trabalho de sua mãe, que era parteira, e ele dizia fazer o mesmo, só que enquanto sua mãe auxiliava no nascimento de uma criança, Sócrates auxiliava no nascimento de uma ideia. E o caminho para alcançar essa ideia era o método por ele disseminado, que se utilizava da conversação para alcançar o objetivo final, a Verdade. 


Esse método passou a ser uma das principais ferramentas no processo de se chegar à Verdade, inclusive, no decorrer da história, foi uma das principais metodologias de ensino, por exemplo, até os dias de hoje, nas escolas, muitas das vezes se utiliza a ferramenta dialética para atingir um objetivo. Obviamente, guardada as devidas proporções e as modificações que ocorreram no decorrer da história, que não me cabe, agora, julgar se boas ou ruins. Mas fato é, que um dos principais métodos de chegar a conclusões válidas é o método socrático dialético. 


Outra importante contribuição de Sócrates na formação do pensamento ocidental foi o conceito de Consciência Individual. Mas o que realmente significa essa ideia e como ela ajudou a formar o pensamento ocidental? Pois bem, a Consciência Individual, ou o conceito de alma individual pode parecer comum para o homem moderno, no entanto, assim o é justamente por conta de Sócrates. 


Veja bem, no contexto socrático, a consciência era coletiva, a vida que realmente importava era a da Pólis, portanto, as decisões coletivas sobrepujaram em importância as individuais. Os sujeitos se consideravam como parte da coletividade, por exemplo, a religião era estatal, inclusive não acreditar nos deus da cidade, e pior ainda, acrescentar novos deuses em que a cidade não acreditava era um crime, que poderia resultar em morte.


Outro exemplo era a construção da mentalidade coletiva através dos exemplos, inicialmente com as grandes histórias de heróis, principalmente baseadas na Ilíada e na Odisséia, que praticamente formaram o imaginário grego do período. Após isso, o Teatro greg era a grande ferramenta de formação do imaginário social, inclusive com financiamento estatal. Portanto, a mentalidade ateniense era formada para pensar o ser como um integrante do todo, sem sua individualidade ser incentivada. 


Nesse contexto, Sócrates revoluciona o modo de pensar o indivíduo, propondo o conceito de alma individual e de consciência individual. Primeiramente apresentando o conceito de Alma, que não era identificada como individual. Para Sócrates a alma é a essência do homem, pensamento revolucionário para a época. Para comprovar isso, o conceito de alma individual nunca teve a conotação dada por Sócrates e posteriormente passou-se naturalmente a adotá-lo de modo natural. 


Inclusive, a própria morte de Sócrates, encarado como um ato político, foi uma resposta ao pensamento individual de Sócrates, por com esse conceito difundido, o Estado seria gradualmente enfraquecido, e a alma coletiva, tão forte na Atenas do período, seria suplantada pelo conceito defendido pelo filósofo. 


Outro assunto relevante e influente no Ocidente foi a defesa do discurso como transmissor da Verdade. Principalmente como uma contraposição ao movimento sofístico da época, em que esse “mercadores do saber”, como dirá posteriormente Aristóteles, manipulam o discurso e o utilizavam como uma ferramenta de convencimento, independente de ser verdadeiro ou não. 


No entanto, como uma contraposição a esse movimento e prática, Sócrates defendia o discurso como uma expressão da Verdade, ou seja, a função do logos (palavra, discurso) era transmitir a Verdade e não opiniões. E essa era a responsabilidade, segundo Sócrates, de quem detinha a palavra, ser responsável por conectar a palavra à realidade, a fim de transmitir um discurso verdadeiro e não manipulativo, como era a prática comum dos sofistas da época. 


Esse conexão, do discurso com a realidade, defendida por Sócrates, formou um dos grandes conflitos do pensamento ocidental, pois ainda hoje muitos acreditam nas palavras como uma ferramenta de convencimento, independente da Verdade. Mas para Sócrates o dever do orador é fazer e transmitir um discurso que corresponda com a Verdade.


O que o homem moderno pode aprender com Sócrates?


Passemos a refletir quais as principais contribuições de Sócrates para o homem moderno. Como visto no corpo do texto, Sócrates foi muitíssimo relevante em seu contexto histórico, tanto positivamente, considerando seus discípulos e alunos, quanto negativamente, como seus opositores e acusadores. No entanto, objetiva-se agora transportar os ensinamentos e vida de Sócrates para o mundo moderno, considerando os dilemas da contemporaneidade, imaginando se Sócrates poderia contribuir, mesmo estando a mais de 2000 anos distante. 


Primeiramente, um dos aspectos que o filósofo tem a ensinar, e consequentemente contribuir ao homem moderno é a sua vida coerente. Em uma sociedade de aparências, principalmente quando se considera o dilema das redes sociais e a vida por meio das telas, onde o indivíduo moderno quer aparentar uma vida que muita das vezes na realidade não tem, Sócrates se apresenta como aquele que aconselha tal homem.


Sócrates foi honesto com o seu pensamento, inclusive diante da morte não negou suas convicções e rejeitou a oferta de fuga de seu amigo Críton por ser contra as suas convicções, ou seja a sua filosofia. Pode-se pensar no “filósofo” moderno, ou seja, o professor de filosofia que por estudar 4 anos na faculdade e ter um diploma diz-se “filósofo”. Esse indivíduo pode, e é comum que seja, falar sobre filosofia, sobre virtude, sobre ética e moral, baseado nos grandes autores, mas a sua vida pessoal não ter a mínima relação com a sua “filosofia”. Algo impensado para Sócrates.


Diante disso, a primeira lição socrática ao homem contemporâneo é a necessidade de correspondência entre a sua filosofia, seu pensamento, sua crença e a sua vida prática. Honestidade intelectual e prática é um dos caminhos para a felicidade, como ele mesmo defende em sua obra. 


A segunda contribuição seria o amor pela Sabedoria, mas não como algo que se possa adquirir para algum fim, muito pelo contrário, o amor à Sabedoria é o que possibilita o homem viver a sua plenitude. A Filosofia, entendida como amor à Sabedoria, é o pilar do pensamento socrático. Mas amá-la implica algumas coisas que às vezes o homem moderno não está disposto a investir. 


Amar a sabedoria implica buscá-la com todas as suas forças, como um objetivo de vida, não com alguma outra finalidade, objetivando alguma outra coisa, mas como fim em si mesma. Também implica abrir mão daquilo que atrapalha alcançá-la, pois como diz Platão, verdade conhecida deve ser verdade obedecida. Ou seja, se algo não é virtuoso e não o conduz à sabedoria, deve ser repensado e provavelmente descartado. 


Transpondo ao mundo moderno, pensar em amor à filosofia e abdicações para alcançá-la para impensável. Primeiramente pelo aspecto materialista do mundo moderno. Se deseja, com intensidade, apenas produtos/coisas que o dinheiro pode comprar. Pensar em algo imaterial parece um absurdo para o materialista moderno. 


Segundo, balizar a vida pela busca da sabedoria irá exigir determinação e abdicação dos divertimentos modernos, o que parece inviável na contemporaneidade. Imagine, trocar uma partida do seu time do coração por um livro, ou a novela por ir ao teatro, ou ainda, as músicas atuais por Bach, Beethoven ou Mozart. Fazer essas trocas conscientes, pensando na evolução do espírito, no amadurecimento da alma e na busca pela sabedoria é o que nos convida Sócrates, principalmente quando nos diz: “Uma vida irrefletida não merece ser vivida”.


Finalmente, talvez a principal contribuição que Sócrates pode oferecer seja como viver, mas não apenas isso, mas como viver bem, como ser efetivamente feliz. É possível identificar essa característica no decorrer de sua vida, mas principalmente no final dela, pois como dizer, filosofar é aprender a morrer, e Sócrates pode ter esse título, inclusive impressionando seus amigos no leito de morte, em que esperavam uma reação diferente e comum, lamento, tristeza… Mas o filósofo se manteve sereno, e sedento de dialogar para quem sabe se tornar mais sábio. 


Para Sócrates, a boa vida esta conectada com a virtude, e a virtude essencial ao ser humano, aquilo que o realizada completamente como ser é a busca pela sabedoria. E não uma busca superficial e interesseira, mas uma busca sincera e honesta. Diante disso, Giovanni Reale diz:

 

“Se o homem distingue-se pela sua alma, e se a alma é o eu consciente e inteligente, então areté, ou seja, aquilo que atualiza plenamente essa consciência e inteligência, não pode ser senão a ciência e o conhecimento. O valor supremo para os homens é, portanto, o conhecimento.”

Portanto, se Sócrates pode contribuir ao homem moderno seria no sentido de dizer: “Busque o conhecimento, atualize a sua alma através das virtudes e ame a Sabedoria.” Portanto, parece que Sócrates encontrou a fórmula da boa vida, da vida efetivamente feliz, que é a busca pela sabedoria através das virtudes a fim de exercer o fim último do homem que é conhecer e tudo isso alinhado a uma vida prática, honesta e sincera.

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